Reinventando as coroas ovais. 
Aqueles que pedalaram uma bike equipada com componentes Shimano por volta do início da década de 90, devem estar lembrados do nome Biopace. Tratava-se de uma tentativa da gigante japonesa em manipular o diâmetro das coroas dianteiras de forma a tornar o ato da pedalada o mais natural e uniforme possível, além de potencializar o uso da energia empregada no movimento de rotação do pedivela. O sistema primordialmente desenvolvido para o ciclismo de estrada foi aplicado ao MTB, erro que acabou por resultar no abandono posterior do Biopace, que constatou-se, não funcionava bem na terra e era incompatível com a maneira de pedalar e cambiar numa mountain bike.
Acompanhando o circuito mundial nos últimos tempos, me chamou bastante atenção o crescimento do número de profissionais usando coroas elípticas, desde atletas do cross-country como Christoph Sauser e Todd Wells, até expoentes do mundo singlespeed como o excêntrico Fuzzy Mylne, além, por exemplo, do sprinter Thor Hushovd que no momento disputa o Tour de France. As coroas em questão são fabricadas na Espanha pela RotorBike, uma usina de inovações que também produz, entre outros componentes, pedivelas usinados que são verdadeiras obras de arte de engenharia.
As coroas ovais Biopace eram menores em diâmetro na altura do ponto de força da pedalada e maiores nos ditos "pontos mortos" parte da curva onde os pedais atingem a menor distância em relação ao solo. O objetivo era acelerar os pedais na fase de compressão do círculo para depois promover uma leve desaceleração na altura do "ponto morto" e com isso acumular energia cinética nos pés do ciclista para quando os pedais iniciam o arco para retornar ao seu ponto superior. Apesar do conceito relativamente complicado, na prática o Biopace era eficiente e seus benefícios podiam de fato ser sentidos.

Os engenheiros da RotorBike tomaram um caminho contrário ao da Shimano, criando coroas em que o maior diâmetro coincide com o ponto onde a perna do ciclista produz o maior torque e o menor diâmetro onde a pedalada seria mais fraca. O sistema espanhol visa otimizar o uso da força empregada pelo ciclista no ato da pedalada, reduzindo a quantidade de energia requerida para movimentar os pedais na posição onde a musculatura da perna é menos efetiva.
As Q-Rings, como são conhecidas, são produzidas em liga de alumínio 7075 e usinadas em CNC. Essas coroas foram testadas extensivamente, inclusive por algumas universidades de renome na Europa. As conclusões do estudos mostraram uma maximização da energia gerada na pedalada e, em contra-partida, uma diminuição da taxa de respiração e da frequência cardíaca nos ciclistas testados.

Antes cético em relação às coroas ovais, comecei a considerar a idéia de usá-las quando montei como singlespeed a bike de testes do
P29BR, a Niner SIR9. Com o relevo acidentado da minha região, qualquer ajuda extra, como a prometida pela RotorBike, seria bem-vinda para se pedalar montanha acima com apenas uma velocidade.
Para um brasileiro a aventura de adquirir as Q-Rings não é tarefa das mais simples, além de dispendiosa. O sistema completo, com 3 coroas para MTB custa perto de 300 dólares! As Q-Rings dificilmente encontradas em lojas, são vendidas diretamente no site do representante americano (
http://www.rotorbikeusa.com) que não envia os produtos para fora dos EUA. Por questões de custo e pelo fato de pessoalmente não ter certeza quanto à veracidade de suas propaladas qualidades, optei então apenas pela coroa do meio, de 33 dentes, que poderia tanto ser usada para singlespeed, quanto para uma montagem com marchas. O custo dessa coroa única é de 93 dólares. A RotorBike oferece também um modelo específico para singlespeed, com 34 dentes, custando salgados 135 dólares.

As coroas Q-Ring são acompanhadas por instruções detalhadas de instalação. Você pode estar se perguntando se existe alguma ciência por trás da simples montagem de uma coroa no pedivela, no caso do produto da RotorBike, existe sim, o sistema OCP (Optimum Chainring Position). O OCP usa três pontos diferentes de ajuste da coroa em relação ao pedivela, permitindo adaptar a coroa à forma de pedelar de cada ciclista, tanto daquele que pedala mais tempo em pé, quando daquele que se posiciona mais na parte traseira da bike. Sugiro ao comprador que experimente as Q-Rings cada uma das posições de montagem antes de escolher a mais adequada a seu estilo de pedalada.

As primeiras pedaladas passam uma certa sensação de estranhamento, mas bastam alguns minutos e você já começa a se perguntar porque as grandes marcas, Shimano e SRAM, não investem em nada parecido. Depois de alguns dias realmente é possível perceber uma pedalada mais "redonda", mesmo numa bicicleta com velocidade única. A variação de diâmetro nessa coroa oval é sutil a ponto de não requerer um esticador de corrente na Niner SIR9, ao contrário, nada sutil a ponto de definitivamente melhorar o desempenho de um piloto a bordo de uma singlespeed.
A montagem da coroa elíptica da RotorBike em um pedivela triplo se mostrou uma tarefa um pouco mais complicada. Como somente a coroa do meio seria a ovalada, foi mais difícil encontrar a melhor regulagem para o câmbio dianteiro e posicioná-lo de forma alta o bastante para não encostar na Q-Ring quando a corrente estivesse na coroa grande, mas baixa o suficiente para trocar rápida e corretamente as marchas. Depois de todo regulado, o desempenho da pedalada com a Q-Ring foi mais uma vez claramente superior ao modelo "redondo" padrão.

Tanto o antigo sistema da Shimano, quanto o atual produto da RotorBike, reinvindicaram para si a qualidade de minimizar o efeito do "ponto morto" no arco da pedalada, de qualquer forma, hoje parece claro que os espanhóis encontraram a melhor fórmula. As Q-Rings podem ser consideradas uma ajuda a mais na busca do conjunto perfeito, se você é um competidor nato, qualquer pequena melhoria numa já bem montada bike se converte em uma real vantagem ao final de muitos quilômetros. O corajoso usuário de singlespeed é outro que pode ser muito beneficiado com o emprego dessas coroas ovais, eu recomendo! Sinto apenas que o preço seja tão salgado e que ainda nenhum importador brasileiro tenha se interessado em distribuir o produto por aqui, de qualquer forma, vale o esforço para se adquirir os produtos da RotorBike, se o bugdet permitir, escolha todos os três tamanhos para compor seu pedivela.
Keep 29eriding!